Eu escrevi esse poema, Poliuretano, depois de um episódio traumático de quase asfixia por um incêndio no meu quarto, uma vela de citronela que esqueci acesa à noite. João tava lá na casa de Campinas, no quarto da Olívia no andar de cima, e desceu quando me ouviu abrindo todas as janelas. Fomos dormir 5h da manhã. Depois ele escreveu Poliuterino.
Poliuretano
Meu corpo coberto
Minha cama coberta
Meu corpo e minha cama cobertos de fuligem
Last night you guys almost found me dead in the plastic smoke
You guys almost found me dead last night
thank you João for saving me
from my mind
I saved myself from the smoke and
You saved me from myself
Chorar por detrás dos olhos, sim
A agonia,
o grande estar-mudo
(chorar por detrás dos olhos)
Não quero acordar. Acordei,
tomei banho, limpei
a fuligem nas narinas
Sei que seus olhos arderam, os meus também
(assim como o criado-mudo, derretendo lentamente, sono e silêncio)
Te dei íons para que eles parassem de doer e
Fiz comida,
como “Matou a família depois foi ao cinema”:
“Salvou-se do incêndio depois chamou os amigos para comer brigadeiro”.
Poliuterino
meu corpo coberto de novo
casa feminina acolhedora como útero
distante, e efêmero
nove meses em uma semana
e depois ficar sozinho
saudade eterna
me salvaram de mim mesmo
— hora de não enlouquecer! —
cuidado materno, química amniótica, íons
poção de sangue em cima do fogão
mulheres distantes dos úteros de onde saíram (mulherão da porra!)
fogo, transformação irreversível
mutações aleatórias
antropogênese, antropofagia
a concepção de um novo ser, a construção da identidade
noppera-bōs dançando, sincronizando os passos
macios, plásticos — homens não-líticos
sinestesia, memória
tai chi e música que transportam
choro de criança, choro e infância
REGRESSUS AD UTERUM
retorno ao conforto primitivo
the silence that's suddenly heard after the burning of a candle
you won’t see me you’ll only see that you can’t see very far
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